terça-feira, 29 de abril de 2008

Qual será o próximo point

Por: Aline Pires e Jadson Dias


Ela não sente prazer quando realiza o seu trabalho. Elielma de Carvalho, Eli como prefere ser chamada, é uma mulher de 35 anos que se resume em separação, traição, perda, e descaso social, esta mulher teve a vida marcada por desilusões e muitas cicatrizes espalhadas pelo corpo. Há seis anos, por motivos de saúde e revolta com a traição e abandono do marido, viu na prostituição o único meio de ganhar dinheiro sem precisar usar as mãos. Após viajar por várias cidades do interior a trabalho, Eli chegou a três meses na cidade da Cachoeira, por intermédio de uma amiga e também prostituta. No Point das Morenas, famoso prostíbulo da região, onde encontrou emprego, algumas boas amizades e R$ 25,00 por programa feito. Desse dinheiro, cinco reais ficam para a dona do estabelecimento suprir com os gastos da alimentação e estadia das ‘meninas’ na casa.

Infância e adolescência

Oriunda da cidade de Valença na Bahia, Eli, desde muito nova teve de se adaptar com a separação dos pais. As brigas eram constantes, e cenas de violência doméstica faziam parte do seu cotidiano. Filha única teve que morar ao lado do pai, com quem sempre teve um relacionamento estável. Ainda na infância, descobriu através de exames que tinha esclerose múltipla, uma doença degenerativa, sem cura, que atinge principalmente jovens e adultos. A esclerose múltipla não é letal, mas sua progressão pode acarretar, nos casos graves, em paralisia de membros ou perda da visão. Aos 17 após manter um relacionamento, engravidou de um rapaz, que faleceu em um grave acidente de moto quando ela estava com seis meses de gestação. Mãe solteira, e sem condições financeiras, teve que abandonar os estudos e trabalhar como doméstica. Após anos difíceis, conheceu o homem com quem se casou e viveu durante quinze anos, cuidando e mantendo mãe e filha.

Traição

Em uma quarta-feira nublada, como era de costume, Eli chegou do trabalho, que fazia com muita dificuldade, devido ao atrofiamento de suas mãos. Ao entrar em casa, notou algo diferente, podia-se ouvir suspiros e gemidos vindos de dentro do quarto. Ao se aproximar deparou-se com a cena que mudaria completamente o rumo da sua vida. Totalmente nu, seu marido se contorcia de prazer agarrado a uma mulher em sua própria cama. Após alguns instantes de observação pode perceber que se tratava da sua vizinha. Pessoa em que depositava total confiança e jamais esperava tal atitude.
Após descobrir a traição, Eli se separou, e daí por diante sua história mudou de configuração. Sem poder trabalhar, pelo avançado estágio da doença, e sem poder manter a sua filha adolescente, foi apresentada ao mundo da prostituição onde vive até hoje.

Prostituição

Quando o assunto é prostituição, diversas polêmicas surgem e há opiniões divergentes. Por um lado existem aqueles que acham uma profissão como qualquer outra, por outro, existem os defensores da “moral” e do “respeito”, não admitindo a hipótese da regulamentação da profissão. Fato é que a história relata casos de prostituição desde os primórdios da sociedade, “a profissão mais antiga do mundo”, como afirmou Elielma.
Existe um projeto em andamento para modificar determinados artigos em vigor que é o de nº98, de 2003(Do Sr. Fernando Gabeira), em que dispõe sobre a exigibilidade de pagamento por serviço de natureza sexual. Na Bahia, as profissionais do sexo da Associação das Prostitutas da Bahia (Aprosba) colocaram no ar uma rádio chamada Rádio Zona, que visa combater o machismo, racismo, homofobia e a estigmatização das prostitutas e garantir os direitos humanos e sexuais. Na associação as profissionais do sexo lutam por seus direitos e, além disso, fazem com que a sociedade supere preconceitos e discriminações.
Eli defende a regulamentação da profissão, pois segundo ela é como qualquer outro trabalho que exige horas de dedicação e esforço. “Segunda é meu dia de folga, não tem quem me faça trabalhar na segunda. Também sou filha de Deus e mereço um dia, pelo menos, de descanso”, comenta.

Aposentadoria

Sempre a passos lentos, quem a vê de longe, pode notar sua dificuldade em se locomover. Suas pernas parecem desalinhadas, uma maior que a outra, devido a forma como ela manca. Uma faixa preta está sempre fixada em seu joelho esquerdo. E segundo ela, as dores aumentam com o frio e ela já prevê a impossibilidade de estar trabalhando na cidade da Cachoeira com a chegada do inverno no mês de junho.
Devido ao agravamento do seu estado de saúde, Eli já pensa em dar entrada novamente no pedido da aposentadoria sendo o que a primeira tentativa foi negada devido a burocracia do INSS (Instituto Nacional de Seguro Social). Praticamente inválida e já tendo sofrido duas paradas cardíacas, sua visão comprometida devido à medicação que é submetida, e as articulações degeneradas, as suas possibilidades de contornar esta situação são limitadas. Só lhe resta agora uma certeza. A de que a vida pode chegar ao fim a qualquer instante, e que esse tenha sido o seu ultimo point.

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