quinta-feira, 8 de maio de 2008

Saudoso Subaé

Matéria editada

Moradores de Santo Amaro relembram o tempo em que o rio da cidade era limpo

Marlene Lima

Vagarosamente, ele corta as terras, rompe barreiras e chega ao seu destino. Impiedosamente, suas águas transbordam, causam caos, famílias perdem pertences pessoais. Pessoas ficam sem ter onde dormir quando chega o inverno e a chuva parece cair sem parar.
Sua nascente, Feira de Santana. No percurso diário, ele banha terras de outros lugares por onde passa. Arraial do Limoeiro, São Gonçalo dos Campos e Campinhos. Antes de penetrar terras santo-amarenses, ele recebe as águas do riacho de Itaquarí. Já em terras santo-amarenses, recebe os afluentes Traripe e Sergi Mirim.
O rio Subaé foi o berço para a construção da cidade de Santo Amaro da Purificação, desempenhando importante papel na economia e desenvolvimento locais. Quando, no século XVI, os portugueses chegaram, encontraram às margens deste rio os índios Abatirás. Mas logo eles foram expulsos. Às suas margens, ao longo da história, casas foram construídas, o comércio foi estabelecido e a cidade foi formada. Muitas crianças nele brincavam, tomavam banho. As donas de casa lavavam roupas, algumas famílias tiravam dele o sustento. “Os meninos pegaram 'amoreira'. Êta peixinho bom. Mas não pegaram só isso. Tem bagre também. E esses aí têm mais de um palmo. A mesa hoje vai está farta”, relembra a historiadora Zilda Paim.
Em suas margens, mato, muito mato, de todos os tipos. Em suas margens lixo, lixo de todo tipo. E não só nas margens, dentro dele também. Suas águas estão sujas, barrentas, sendo penetradas por esgotos. Seus peixes não são mais saudáveis para alimentação. Mas isso não significa que foi sempre assim. “A água é bem clarinha, dá pra ver a areia e ela é bem clarinha. Olha! Aquelas pedrinhas de seixo dá pra gente brincar de capitão de areia. Vamos meninas! Vamos logo! Antes que a mamãe nos chame pra casa. Ainda quero andar de canoa e ver os peixes pularem dentro dela”, rememora a historiadora.
PROGRESSO VAZIO - Segundo Zilda Paim, a devastação do rio começou quando, em meados dos anos 60/70, foi criado, em Feira de Santana, o Centro Industrial do Subaé (CIS). Todos os resíduos produzidos pelas fábricas da cidade desciam para rio. Somado a isso, está a instalação da Companhia Brasileira de Chumbo (Cobrac), subsidiária da empresa francesa Penarroya, na cidade de Santo Amaro. Os resíduos industriais da Cobrac eram jogados no rio. A população até hoje sofre as conseqüências. Esperava-se progresso e desenvolvimento para a cidade, porém, as devastações foram mais perceptíveis e vividas pela população.
A historiadora comenta ainda que o rio Subaé tinha um metro e meio de profundidade, mas as enchentes traziam muita areia e hoje a profundidade não chega a um metro. A devastação do rio Subaé foi letra da música de Caetano Veloso, “Purificar o Subaé”.

LEMBRANÇAS - Seu Ivo Souza, 79 anos, lembra saudosamente da sua infância, das brincadeiras que ele e seus amigos faziam no rio.
- Pés descalços, sem camisa, a gente corria pra brincar no rio. Naquela época não tinha aquela ponte ali não, olhe (apontando para a ponte que liga o bairro do Sacramento, em Santo Amaro, com a rua que chega à praça da Purificação).
- Tá vendo onde está aquela escola? Ali só tinha era roça. E a gente brincava no meio das roças (agora ele aponta para a escola Estadual Pedro Lago).
Sentado em um banco de madeira no fim de uma tarde de quinta-feira, seu olhar estava fixado no rio. Vez ou outra falava com um amigo que passava. Em meio a um sorriso de uma criança, que ganhou um brinquedo novo, ele relembrou sua época de menino.
- Às vezes a gente vinha brincar no rio e tomava banho de noite mesmo. O rio naquela época era limpo. A gente tomava banho, as mulheres lavavam roupa, a gente bebia a água dele. Hoje, ninguém pode mais utilizar este rio. Algumas pessoas pescam, mas não são alimentos saudáveis.
O rio agora está chegando ao seu destino. Ele encontra-se com o rio Pitinga e passa a se chamar Sergipe do Conde, que deságua na Baia de Todos os Santos. Enquanto isso, ainda não se sabe qual será o seu destino, quando ele será recuperado. É o próprio “horror de um progresso vazio”.

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