quinta-feira, 8 de maio de 2008

Entre peixes e histórias

Matéria editada

Na Ponte D. Pedro II, homens pescam e presenciam acontecimentos inusitados

Gislene Mesquita

6h45min da manhã. Lá estão eles. Será que chegaram cedo ou viraram a noite? Vai saber... Apesar do sol não estar muito forte, a temperatura está alta, o tempo bastante abafado. A movimentação na ponte D. Pedro II não parece incomodá-los, eles sequer percebem. Pessoas indo e vindo com andar apressado, carros fazendo barulho, crianças chorando, gente conversando alto... Movimentos, vozes, ruídos e sol escaldante contrastam com a concentração, tranqüilidade e paciência daqueles homens: os pescadores da ponte que liga Cachoeira e São Félix.
João Alberto Oliveira, 65 anos, pescador, diz: “Aprendi a pescar com meu pai, que também era pescador. Sempre vivi disso, nem saberia fazer outra coisa”. Seu João, como prefere ser chamado, além de consumir os peixes que pesca, também os vende na feira. “O dinheiro não é muito, mas recebo também a Bolsa Família, então, dá para ir levando”, comenta. Ele trabalha quase diariamente, chega à noite e fica até o amanhecer. “À noite é mais fresco e não tem zoada, para mim é o melhor horário”. Seu João é casado, mas mora só. Sua mulher mora na zona rural com os seus três filhos.

Ao ser questionado se já presenciou alguma história interessante na ponte, diz que não. Depois, pensativo, acrescenta: “uma vez, bem tarde da noite, dois jovens bêbados apostaram uma corrida de moto aqui na ponte. Um deles se desequilibrou no trilho e caiu da moto. O outro, que estava à frente, foi olhar para o amigo, perdeu a direção e caiu também”, diz.
Edvaldo da Costa Pereira, 51 anos, é outro pescador da ponte. “No início pescava só para me distrair, relaxar, passar o tempo, mas, desde que perdi meu emprego de mecânico, pesco para me sustentar”. Edvaldo trabalha de segunda à sexta, das 5h às 14h. “Às vezes venho pescar até dia de sábado ou domingo”. Os peixes são vendidos na feira e, segundo ele, o lucro é compensatório. “Têm dias que o rio está bom, outros não, mas aí eu fico mais tempo, para compensar”, explica.
Edvaldo também já presenciou muitos casos na ponte D. Pedro II. Dentre eles, um acidente com uma pessoa. “Uma vez uma senhora não viu um buraco e caiu. A perna dela ficou presa entre as tábuas e precisou da ajuda de várias pessoas para tirar”, afirma ele.
CRIANÇAS E BRIGAS - Martins Ferreira Lima, 48 anos, é também um pescador, mas só pesca uma vez ou outra. Martins trabalha fazendo biscates e os peixes que pesca são para consumo próprio. Para ele, o melhor horário é à noite, pois a tranqüilidade é maior e ninguém o incomoda. Martins conta que uma vez viu um garoto tentar suicídio. “Ele não chegou a pular no rio, as pessoas logo o tiraram da ponte”, relata.
“Pesco todos os dias, a partir das sete horas da noite”, comenta Marcos Xavier, 37 anos, que trabalha durante o dia como motorista, e, à noite, pesca por distração e para o consumo próprio. Ele diz que não é sempre que a pesca está favorável, depende do rio, quando está baixo tem mais peixe.
A respeito de histórias presenciadas por ele na ponte, diz que têm algumas. “Geralmente tinha umas crianças por aqui brincando de pular da ponte. Uma vez uma delas, ao pular, bateu a cabeça na pedra e morreu”. Outro caso que Marcos conta foi de um casal que, passando pela ponte, estava discutindo. “De repente, o homem agarrou a mulher e ameaçou jogá-la da ponte. Foi um dos pescadores daqui que o impediu”, conta ele.

20h. Lá estão eles. São os mesmos da manhã? Provavelmente não. O tempo está agradável, fresco. O movimento na ponte está baixo. Nesse momento é difícil não notar a presença deles. Lá, concentrados, silenciosos, pescando seus peixes. A cena é bucólica. Transmite paz, tranqüilidade. São eles: os pescadores da ponte.

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