quinta-feira, 27 de março de 2008

Matérias do Reverso Editadas

Transporte

Conexão Recôncavo

Vans integram as cidades da região e são muito mais do que um meio de transporte

Gabriel Amaral Pires, Jadson Dias, Lorena Andrade, Maísa Almeida

Os moradores das cidades do Recôncavo dificilmente viveriam sem o chamado transporte alternativo. Mais do que um meio de locomoção, as vans interligam os municípios, suas culturas e nelas é possível ouvir as mais diversas histórias. Alguns motoristas e cobradores, que às vezes entram em conflito, se consideram analistas dos passageiros. Os clientes, no entanto, nem sempre são respeitados. Na vida dentro das vans, amigos se encontram, segredos são revelados e até casos de assédio sexual já foram relatados.
Os passageiros preferem usar o transporte alternativo pela rapidez em relação aos ônibus. Enquanto as vans saem a cada quinze minutos, tendo pontos de parada específicos em cada cidade somente para embarque e desembarque de passageiros, os ônibus têm horários de intervalo maior e, segundo os próprios passageiros, o desconforto maior é com as paradas nas rodoviárias das cidades até chegar ao destino final da viagem.
A técnica em contabilidade Carla Suzard, 32 anos, viaja pelo menos cinco vezes ao mês para Feira de Santana e sempre usa o transporte alternativo. Ela prefere as vans pela agilidade, mas ressalta que o ônibus é mais confortável. “Sempre que procurei os serviços deste transporte não houve superlotação, porque os passageiros reclamam se isto ocorrer”.
Em Cachoeira, existem quatro associações. A ASCONF (Associação dos Condutores de Conceição da Feira), que faz a ligação entre Cachoeira e Conceição da Feira, COOTAM (Cooperativa de Transporte Municipal), responsável pelas cidades até Cruz das Almas, como Muritiba e Governador Mangabeira e a ASCAMUCA (Associação dos Condutores Alternativos do Município da Cachoeira), que transporta até Feira de Santana. Uma última, não registrada, conduz passageiros até Salvador. O transporte alternativo no Recôncavo marca o encontro de culturas que se encontram e compartilham diversas histórias.
O presidente da ASCAMUCA, Ubirajara Filho, conhecido como Juninho, falou das condições de trabalho dos condutores no dia-a-dia. Segundo ele, a situação de trabalho hoje é muito mais difícil. “Há dez anos você tinha condições de dar quatro viagens para Feira de Santana, hoje dá uma”. Muitos motoristas trabalham até 12 horas por dia. Em algumas épocas, como no São João, é possível tirar até R$ 1.500. No entanto, a média semanal normal é de R$ 400.
O transporte alternativo no Recôncavo, além de mais freqüente, ganhou ares de um novo espaço que vai além da mera locomoção. Uma espécie de divã ou lugar de encontrar amigos e conhecidos. Raramente não se ouve nestas vans conversas íntimas ou não se vê algo inusitado acontecer. Como presidente da associação e motorista, Juninho já presenciou várias dessas histórias. “Eu costumo dizer que nós motoristas não estamos sentados em um banco, mas em um divã, eu tiro por mim que às vezes viro psicólogo”.
Segundo Juninho, existem algumas histórias curiosas de pessoas que, num pequeno trajeto entre Feira de Santana e Cachoeira, contam as histórias de sua vida. “Teve uma menina que entrou no carro e começou a chorar. Eu perguntei se podia ajudar. Ela disse que não, mas logo depois desabafou que o seu pai não queria que o namorado dela, que mora em São Félix, fosse passar o fim de semana com ela em Cruz das Almas. Tentei consolá-la dizendo que os pais sempre pensam que os filhos ainda são crianças”, lembra ele.
Além dessa, histórias como a de uma passageira que saía quase todos os dias no mesmo horário de Cachoeira para ter um caso com um taxista em Feira de Santana e de um grupo de italianos que fretou o carro do Juninho para irem até Morro de São Paulo. “Um deles me perguntou se podia fumar maconha. Eu falei para eles ficarem à vontade. Eu comecei a tossir e já tava doido de tanta fumaça daqueles gringos. Eu tive que abaixar o vidro e parar o carro para tomar água”, conta ele, rindo.

Nenhum comentário: