quinta-feira, 20 de março de 2008

Isto é uma ata?

Provocações de um intelectual

Bernard-Henri Lèvy defendeu maior atuação de pensadores em palestra anteontem, no TCA

Ana Cristina Pereira

Uma espécie de arqueologia de si mesmo. Foi a essa reflexão que se entregou o filósofo, jornalista e escritor Bernard-Henri Lèvy para tentar responder qual seria “O papel do intelectual na sociedade contemporânea”, foco da fala inaugural do ciclo Fronteiras Braskem do Pensamento. Falando para uma platéia numerosa, anteontem, no Teatro Castro Alves, ele não polemizou, como muitos esperavam, mas defendeu que os pensadores do nosso tempo devem ter uma ação mais efetiva na sociedade.

No prólogo um tanto quanto demorado, Bernard-Herri Lèvy disse que poderia abordar o tema de várias maneiras, como apontando os momentos no século XX em que os intelectuais se calaram diante de várias barbáries. “Resolvi falar do que conheço menos mal, da história intelectual da minha geração, e da minha, em particular”. Ao usar a própria trajetória como exemplo de atuação intelectual, Lèvy chamou para si a responsabilidade, valorizando a importância que tem tido com uma atuação efetiva (em livros, falas e atuando, por exemplo, na cobertura da Guerra da Bósnia) e boas doses de polêmicas.

Entre outras coisas, ele defende, e voltou a fazê-lo no TCA, o modelo de democracia americana como um dos mais bem resolvidos do mundo. “Os Estados Unidos são o país da tolerância generalizada. Superaram os problemas raciais e fizeram uma revolução social. Tem seus problemas, mas o Bush é um parênteses ruim, vai passar. Estou rezando todos os dias para Obama ser o vencedor, mas se for a Hilary também não será ruim”, respondeu à platéia, na sessão reservada às perguntas mediadas pelo jornalista José Raimundo.

Aos 60 anos, Lèvy apontou quatro “pilares” que considera fundamentais para a sua formação e a de seus colegas, pensando, obviamente, no intelectual francês ou europeu: a experiência do nazismo e a tentativa de eliminação dos judeus; os conflitos liderados pelos jovens em maio de 68, na França, reprimidos duramente por Charles de Gaulle; a sangrenta revolução no Camboja na década de 1970 e as recorrentes idéias totalitárias. Lèvy comparou o totalitarismo à ilusão de que é possível curar e eliminar o mal da sociedade e afirmou: “Para eliminar o mal voltamos à segregação”.

Para Lèvy, o escritor e médico francês Louis-Ferdinand Céline (1894-1961) é a ilustração perfeita desse espírito, já que foi abertamente favorável às teorias nazistas em seus textos literários. No final de sua fala, o filósofo defendeu a necessidade de mudanças e da defesa das dignidades dos povos. Um ponto essencial, disse, será o apoio aos intelectuais moderados do Islã. E destacou a vinda a Salvador da política Ayaan Hirsi Ali, somali naturalizada holandesa, que levantou a voz contra os extremistas do Islã.

Ela é a convidada de julho do Fronteiras Braskem do Pensamento, cuja próxima rodada será no dia 29 de abril, com os artistas visuais Christo e Jeanne-Claude. Aprovado pela platéia de convidados de anteontem, o evento promete boas conversas até o final do ano. “É uma proposta muito interessante, pois o saber ultrapassa a questão das fronteiras”, afirmou o Irmão Felipe, monge beneditino que estava acompanhado de outros dois religiosos. A pesquisadora Laura Bezerra, que integra a equipe do Seminário Internacional de Cinema, também achou a idéia “ótima” e a escolha de Lèvy apropriada, mas faz uma ressalva quanto ao preço. “Acho que poderia ser mais barato, de graça ou vendido por palestra”, disse. O pacote para o evento custa R$250 até o final do mês.

Animado com a fala do francês, o escritor Fernando da Rocha Peres disse que achava que “todo intelectual baiano presente deveria buscar os seus pilares”. Um dos seus, elegeu, foi o rico aprendizado no Colégio Central. Já o reitor da Unifacs, Manoel Joaquim de Barros, destacou o estilo direto e sem omissões de Lèvy. “Achei muito bom. Ele não somente é o intelectual que tem o que dizer, mas acredita nele mesmo e no papel do intelectual na sociedade”, resumiu.

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