quarta-feira, 19 de novembro de 2008

A ex-cidade da criminalidade zero ataca

“ Mônica ou Verônica?”


Cachoeira, 18 de novembro.Voltando pra casa depois de comer um hamburguer na Praça 25. Dez e meia noite. Eu, com Dani - moramos juntas - e Jadson que nos acompanha indo também pra casa. Ele mora em São Félix. Conversa agradável, sentamos pra conversar numa parede baixa, todos distraídos, não notamos que alguém nos seguiu.

- Mônica? Pergunta um homem alto, moreno, vestido com uma blusa de botão preta, calça jeans escura, usando um argola prata na orelha direita.

Ele pergunta a Dani, mas eu mesma respondo com um susto que tomo com a pergunta sem lógica, feita por aquele homem estranho e desconhecido.

- Não! Digo com um sorrisinho bem sem graça.

- Verônica então!

O homem que achamos que continuaria caminhando após aquela piada ridícula, pára um pouco afastado de nós e fica. Sentados, sem dar atenção a ele, continuamos a conversar.

- De uma coisa eu tenho certeza, diz Jadson. Se tem uma coisa que acaba com a vida de uma pessoa é a morte.

- Mais o Jadson é besta viu. Retruca Dani.

De repente percebo que o homem começa a se aproximar, e como sou eu quem está sentada na ponta – mais próxima dele - fico assustada.

- Vamo sair daqui né, gente? Percebendo a situação Jadson já vai levantando.

-É, vamo mesmo.

Saímos andando em direção a nossa casa. Jadson resolve nos acompanhar. É aí que percebo que o tal homem veio nos seguindo. Temos que mudar o caminho.

- Vamo aqui pela ladeira que ele vai direto.

- É mesmo, os dois concordam. Quando a gente ia subindo, não é que o miserável resolve ir atrás. De imediato penso: “É hoje!”

- Vixe, ele ta vindo atrás. Avisa Dani já assustada, como os demais.

- Então a gente vai por lá mesmo, vamo seguir direto. Sugiro.

Começamos a adiantar o passo para acompanhar um pessoal que passava na rua, apesar do nervosismo aquele homem tinha ido por um caminho mais longo, seria difícil ele nos acompanhar agora.

-Eu bem reparei, aquele cara chegou de repente foi aproximando, aproximando, chegou muito perto de mim. Tu não reparou não, Dani?

- Eu não. Não percebi nada, tava ali voando na conversa.

- Eu me liguei, é por isso que depois de 10 horas eu durmo na casa de qualquer um pra não ter que voltar pra São Félix só. Os caras falam, mas né não velho. Andar sozinho aqui de noite é barril.

Já estamos perto de casa, Jadson então já dá sinais de que quer voltar pra casa.

- Acho que vou voltar viu, vocês já estão perto agora.

- Pode voltar Jadson, não faz medo mais não.

- É volta mesmo, tu já tá com medo também de atravessar aquela ponte . Acrescenta Dani.

E quando Jadson já está preparado para dar as costas, eis que surge na nossa
frente o tal homem com um ar suspeito caminhando em nossa direção.

- Olha ele ali, diz Jadson.

- Misericórdia, é ele mesmo. Digo mais assustada do que tudo. Travada. Como se diz vulgarmente eu estava como o “cu piscando”.

- Vixe, e agora?

Automaticamente todos viram de costas e começam a andar muito rápido. Praticamente corremos, desesperados. Aquele homem deve ter corrido muito pra subir uma ladeira em tamanha velocidade e já ter descido outra em nossa frente. Ele não estava de brincadeira, isso já estava claro e nós não queríamos pagar pra ver.

-Ai meu Deus.

-Como é que esse homem conseguiu alcançar a gente?

-Eu até pensei nisso, mas eu nunca imaginei que ele ia conseguir alcançar a gente.

A melhor saída naquele momento era entrar por outra rua e bem rápido, porque era evidente que estávamos correndo dele, e ele já havia percebido. Ninguém conseguia olhar para trás mais todos imaginavam que ele estaria correndo atrás de nós.

- Olha aí alguém, olha aí Dani.

- Eu não vou olhar não. Olha aí Jadson.

- Tu é doido, Deus me livre, eu também não vou olhar não.

Ninguém tinha coragem, se já estávamos em pânico em imaginar a correria dele, calcule aí se alguém o vê realmente correndo. Entramos no primeiro beco que encontramos.

- E agora a gente faz o quê?

-Vamo dá um tempo por aqui, se vocês forem pra casa ele vai manjar a cara de vocês, ou então pode tá ali esperando pra fazer alguma coisa.

- Porque a gente não foi pra casa cedo? Dani questiona.

- A gente já saiu do CAHL tarde, com fome, tinha que comer alguma coisa.

- E eu não vou mentir não, eu já tô com medo de levar vocês em casa.

-Pela tua cara ta se vendo Jadson, naquela hora ali tu já tava querendo voltar. -Ainda bem que eu não voltei porque ele ia abordar vocês bem ali.

- Porra, esse cara quer comer a gente Dani!

- E ele deve ta armado porque ele ta vendo, um cara desse tamanho – e aponta para o corpo – e não se intimidar.

- Vixe, meu Deus, “oia” eu não sei não viu. Dani já não sabia o que dizer.

- O jeito é a gente ir lá na polícia falar com os “home”, porque eu não tenho coragem de levar vocês pra casa e nem de voltar pra São Félix só.

Nós olhávamos pra Jadson aflitas, ninguém pensaria numa idéia dessa. “Polícia é demais”. Mas aquela situação estava complicada, o tal homem não estava só tentando nos assustar, até porque isso ele sabia que já tinha feito. Pensei em outra solução.

- Acho que vou ligar pra Júlio, ele vem com Bob e Fred aí não tem perigo não.

Mas será que não mesmo? E se aquele cara encontrar com eles no meio do caminho, e mudar de vítimas? A gente já estava em situação perigosa, incluir mais alguém era arriscado demais.

- O jeito é a gente ir na polícia mesmo.

- Então umbora logo, que ele deve ta vindo atrás da gente.

- Vai, vai. Saímos por outra rua.

A infinidade de becos que sempre penso que existe em Cachoeira naquele momento me parecia bem finita. Aquela paz e tranqüilidade de cidade pacata sumiram. Eu só pensava em correr, só desejava estar segura em casa, mas no momento nenhum lugar me parecia tão seguro quanto a delegacia de polícia e pra lá corríamos.

No meio do caminho...

- Eu quero “mijar”! Jadson já estava com os nervos a flor da pele.

- Pô Jadson, segura aí que na delegacia tem banheiro.

Eu ainda encontrava espaço para fazer piadas Dani ainda conseguia rir, a tensão era tamanha que a gente não conseguia fazer outra coisa. Nunca vi Cachoeira tão escura, tão fria, tão assustadora. Temia encontrar aquele sujeito em todas as ruas e becos da ex-terra da criminalidade zero.
Enquanto Jadson “mija”, eu e Dani conversamos.

-E se ele sair por aquela rua ali, Dani?

-É mesmo vamo por lá.

-Mas se ele estiver cá do outro lado?

- Ih Camila, então eu não sei viu.

Nunca odiei tanto aqueles becos acessíveis por todos os cantos da cidade. Aquelas ruas entrelaçadas que encurtavam os meus caminhos todos os dias, viram naquele instante meus olhos nervosos e inseguros. Medo do homem, raiva das ruas. Ruas expostas e perversas, que me colocaram em perigo.

- Peraí que eu vou olhar dali da esquina se ele ta vindo. Jadson já tinha voltado do “urinódromo”. (Um muro qualquer)

Vai até a esquina e observa. Quando já estamos nos aproximando dele, ele faz um sinal para esperarmos. Aflitas chegamos mais perto.

- Vê aqui se é ele ali?

- Eu não lembro direito dele não, que eu não reparei muito, olha aí Camila.

- É ele mesmo, olha lá todo de preto. E ta procurando a gente, ó como ele foi e voltou olhando por aquela rua.

- Oh vamo logo pra delegacia antes que esse homem encontre a gente.

E fomos.

– Ô Dani, eu tô aqui com uns dezessete reais, um celular novo, um livro e tu ainda ta com a minha câmera na bolsa. Já pensou esse cara assaltar a gente.

- Tua câmera não ta comigo não Camila. Eu tô com uns dez reais e o celular.

- Eu tô com tudo aqui. Um mp4, dois celulares. Um deles eu ainda tô pagando as prestações.

Olho pra trás e vejo alguém estranho vindo.

- Não é ele ali não, né? Esse cara já ta parecendo que é onipresente.

- Oxe, não é ele não menina, aquele ali tá de boné branco.

- Acho que os caras não vão querer me levar lá em São Félix não. Eu vou dormir na casa de vocês, viu?

- Beleza.

-Quem vai falar quando a gente chegar lá?

- Fala vocês que é mulher, faz logo a pressão.

- Ah não! Fala tu Jadson.

- Eu não.

-Então fala, Camila.

- Beleza, deixa que eu falo. Coisa vai ser se eles não quiserem levar a gente. Eu durmo aí viu, pra casa só é que eu não vou.

- Os carros tão aí, eles levam. Me levar em São Félix é que é demais. Dentro da
delegacia, eu vou na frente falando.

-Boa noite, é que a gente ta aqui meio aflito – olha, MEIO aflitos! – porque a gente tava indo pra casa e tinha um homem seguindo a gente, a gente disfarçou foi por outros caminhos, ficou no meio de muita gente, mas não adiantou. Ele continuou atrás, aí quando a gente já tava perto de casa encontrou com ele de frente, aí saiu correndo.

- Vocês já viram esse homem aqui?

- Não.

- Como é que ele é?

- Alto, negro, mas a pele é marrom. Tá com uma blusa de botão preta, e calça jeans, todo de preto. Usa um brinco prata, e tem o cabelo cortado bem baixinho.

-Ele disse alguma coisa a vocês?

- Só mexeu com as meninas, fez uma piada.

-Peraí.

O policial entra e fica lá dentro conversando com os demais. Nós sentados dentro da delegacia, já temos tudo em mente. Se eles não levarem a gente em casa, passaremos a noite por ali mesmo, sentados naquele banco de maneira desconfortável mais seguro. Pelo menos teoricamente. Três policias voltam, um deles com uma arma enorme na mão, o outro com um colete a prova de balas, e entram no carro. Um avisa:

- Vocês não vão pra casa? Vamo! Alguém vai ter que ir no colo

- Não tem nada não.

- Entra Jadson, eu vou no colo de Camila.

Na volta pra casa com os policias não encontramos mais aquele homem. Dani no meu colo com a bolsa escondendo o rosto, não queria ser vista dentro do carro da polícia. Eu não queria estar num carro de polícia. Jadson ao meu lado silencia. Enfim, chegamos em casa. Tudo bem que de um jeito inesperado: Eu pela primeira vez dentro de um carro de polícia, aparentemente segura. Segurança esta que eu já não sinto mais nas ruas acessíveis e perversas de Cachoeira.

Camila Moreira

Um comentário:

Leandro Colling disse...

texto ficou ótimo, só está com uns erros de digitação. revise. pelo menos teve assunto bom para o exercício.