segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Planos fúnebres ganham vida

Funerárias do Recôncavo desenvolvem habilidades para conquistar clientes

Carine Costa

“Não deixe despesas, deixe saudades”. Esse é o slogan da funerária São Félix, que faz parte do mercado funerário dos municípios de Cachoeira, São Félix e Muritiba. Planos funerários são oferecidos aos moradores pelas funerárias Pax Bahia, A Crediária, União e São Félix, que usam de estratégias para atrair a clientela e se manter firme diante da competitividade.
Os gerentes das empresas dizem que aumentou a oferta dos planos, principalmente, a partir dos anos 90, com o término do auxílio funeral (benefício dado pelo governo aos trabalhadores de baixa renda). “A criação do Plano de Assistência ao Funeral tem a finalidade de preservar as famílias no momento da perda de um ente querido, dos oportunistas que se preocupam em ganhar em cima dos familiares, no momento difícil”, complementa Rogério Santos Bispo, 35 anos, proprietário da funerária São Félix.
O plano familiar ou plano funeral oferece aos seus clientes urna mortuária, capela, carro para anúncio, flores, cemitério, viagem, cartório, translado, dentre outros. Esses serviços variam entre as empresas. Para obtê-los, os clientes pagam mensalmente um carnê, que tem valores entre R$ 11 a R$ 34. A dívida cessa somente com a morte do freguês. O período de carência alterna entre três e seis meses. Algumas dessas empresas possuem convênios com farmácias, óticas, laboratórios e clínicas.
Através de vendedores que vão às casas dos moradores, as funerárias oferecem seus produtos com vantagens em relação à concorrência. A maioria dos clientes que adere aos carnês é composta por idosos aposentados, diz Rosângela Batista, 34 anos, funcionária da funerária A Crediária, de Muritiba. Gilvan Pelegrino, 29 anos, proprietário da funerária União, de Cachoeira, declara o oposto ao afirmar a adesão de clientes jovens aos seus planos.
A aposentada Anedina Ramos de Almeida, 63 anos, moradora da cidade de Muritiba, comprou um plano familiar da funerária Pax Bahia e colocou três filhos e uma neta como dependentes. O incentivo veio através de amigos que já tinham aderido ao plano.
“O plano é importante porque deixa o caixão pago, na hora da morte não tem dificuldade, meus filhos não precisarão pegar dinheiro emprestado para pagar, ainda mais que eu tenho problema de coração, diabete, colesterol e pressão alta”, disse Anedina. Porém, há quem não concorde com a idéia, como é o caso de Marinalva dos Santos, de 30 anos. “Eu nunca me interessei porque é uma coisa chata. Uma pessoa com saúde já ficar planejando a morte, com o plano a pessoa já acha que vai morrer logo”, acredita ela.
CONCORRÊNCIA - Segundo Ana Claudia Veloso, 29 anos, funcionária da funerária União, de Muritiba, a funerária Pax Bahia, da mesma cidade, realiza concorrência desleal ao induzir os clientes da União a aderir aos seus planos. “Inclusive, eles chegaram ao ponto de rasgar dois carnês dos meus associados”, garante ela.
“A constituição diz que o cidadão tem o livre arbítrio, tem o direito de ir e vir. Houve transferência porque estavam insatisfeitos. Os próprios clientes rasgaram os carnês. Nós não induzimos, apenas mostramos o nosso trabalho e isso induz de alguma forma, mas nós não obrigamos ninguém”, rebate Wanderlândia Cerqueira, 25 anos, secretária da Pax Bahia.
“Muitos serviços são colocados à disposição dos clientes na hora de vender o plano, como empréstimos de equipamentos de convalescença. Vale salientar que nenhuma empresa de plano empresta os equipamentos, e sim aluga. Cabe aos clientes, quando visitados pelos vendedores, solicitar todas as informações sobre os serviços da empresa. Só os clientes têm o poder de banir a concorrência desleal e fazer com que a empresa cumpra todos os benefícios ditos pelos vendedores e pelas propagandas”, diz Rogério Santos, da funerária São Félix.
Segundo Rosângela Batista, da funerária A Crediária, a concorrência desleal existe e alguns vendedores visitam os doentes já visando realizar o funeral dos mesmos. Rosângela garante que alguns empresários pagam funcionários dos hospitais para serem informados sobre os falecimentos. A enfermeira chefe do hospital Dr. Otto Alencar, de Muritiba, Lívia de Souza, 25 anos, diz não conhecer a existência da prática. “Se eu souber de algum caso a respeito, o funcionário será imediatamente desligado de suas funções”, garante ela.
Na cidade de Cachoeira foram contabilizados 162 mortos em 2007. Em 2008, o número é de 86 óbitos. Para as funerárias do Recôncavo, o interessante é que seus associados tenham vida, pois é através dela que os carnês são pagos e geram o lucro. Para viver e para morrer, custa caro.

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